Planeta dos ricos
Leia artigo semanal de FlĂ¡vio Lauria

Por FlĂ¡vio Lauria*
Publicado em: 13/12/2022 Ă s 19:33 | Atualizado em: 13/12/2022 Ă s 19:33
O texto a seguir NĂƒO Ă© politicamente correto. Nele fala-se em dinheiro, em montanhas de dinheiro; em gente rica, muito rica; em fortunas difĂceis de calcular; em riquezas capazes de provocar delĂrios em qualquer parte do planeta.
Tem mais: o articulista nĂ£o esconde suas mais profundas simpatias pelo mundo dos magnatas e resolveu assumir o axioma do escritor inglĂªs William Davis:
“O mundo ficaria muito mais pobre se nĂ£o existissem os ricos”.
Feita esta indispensĂ¡vel advertĂªncia, vale a pena enfrentar logo o grande rebu: afinal, o que Ă© um rico? Como ele se comporta? Como reconhecer um rico?
Sabemos, com certeza, apenas uma coisa: ele Ă© diferente – de mim e de vocĂª. Mas isso nem sempre basta para defini- lo. A maioria das pessoas, por exemplo, considera rico alguĂ©m que possui um pouco de dinheiro a mais do que elas tĂªm.
Por exemplo, minha COLF (colaboradora familiar, pois nĂ£o fica bem, no terceiro milĂªnio, falar em empregada), estĂ¡ convencida de que eu sou um sujeito muito rico.
Assim como o executivo que, entre salĂ¡rio, 13o e bĂ´nus vĂ¡rios chega a ganhar 200 mil dĂ³lares a cada ano, vĂª no presidente da empresa para a qual trabalha o Tio Patinhas em carne e osso.
Para confundir ainda mais as ideias sobre a maneira de identificar um verdadeiro rico, eis a receita que o bilionĂ¡rio americano Paul Getty (1892-1976, petrĂ³leo e finanças) deixou para a posteridade:
“NinguĂ©m Ă© rico de verdade se consegue contar o dinheiro que tem”.
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Apesar da teoria do abismo, o paĂs tem jeito
Duas histĂ³rias do primeiro milhĂ£o. Me aconteceu ser testemunha de duas histĂ³rias de quem chegou ao primeiro milhĂ£o de dĂ³lares. Que indicam quĂ£o grande seja a diferença de comportamento entre um neomilionĂ¡rio brasileiro.
A primeira cena tem SĂ£o Paulo como pano de fundo. Uma amiga, Deborah, foi me buscar no Hotel Caeser Business, que agora tem outra bandeira, e com um sorriso aberto anunciou:
“Fomos convidados para uma festa muito especial que os Machados organizaram para o filho Thomas Junior, vocĂª nĂ£o pode perder”.
O entusiasmo de minha amiga me deixou perplexo. Certamente nĂ£o consegui esconder o desencanto que tomou conta de mim.
Deborah logo cortou minhas dĂºvidas:
“NĂ£o Ă© nada do que vocĂª estĂ¡ pensando. Thomas Machado Jr. tem 24 anos, Ă© dono de uma pequena indĂºstria de eletrĂ´nica nos Estados Unidos, e a festa que os pais estĂ£o oferecendo em seu apartamento dos Jardins Ă© para que todos saibam que o menino ganhou seu primeiro milhĂ£o de dĂ³lares sem a ajuda da famĂlia, tendo começado do nada, mas que nĂ£o mora no Brasil. Agora, apĂ³s ter pago os impostos, o rapaz quer dizer como Ă© bom ser dono de uma bolada de verdinhas. É uma festa, vocĂª vai gostar”.
A “million party” de Machado Jr. foi algo extraordinĂ¡rio, com duas orquestras, buffet sardanapalesco e bar capaz de embebedar meia SĂ£o Paulo. O neomilionĂ¡rio, seus amigos e fotĂ³grafos vibravam de satisfaĂ§Ă£o diante do altar do sucesso, como personagens de Tom Wolfe em Fogueira das Vaidades.
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O milhĂ£o de Dudu
Lembrei desta festa anos depois, no Rio, quando um amigo com 30 e poucos anos, que chamarei de Dudu para nĂ£o trair seu desejo de privacidade, ganhou seu primeiro milhĂ£o de dĂ³lares construindo prĂ©dios, hotĂ©is e pousadas em BĂºzios.
TambĂ©m Dudu tinha começado do zero. Era um rapaz brilhante e namoradeiro – o queridinho da turma. E desta turma o neomilionĂ¡rio carioca escolheu dez amigos, convidando-nos numa anĂ´nima pizzaria do Flamengo.
Apareceu com camiseta Hering, bermudas e chinelos para dizer que a partir de agora sua vida mudaria. Trocaria o carro do ano por um fusquinha e deixaria o Leblon por um bairro mais modesto. Pediu para que ninguĂ©m falasse de seu sucesso nos negĂ³cios. Explicou, com melancĂ³lica frieza:
“O Imposto de Renda vai cair em cima, a mulherada vai querer se dar bem, os pilantras vĂ£o começar a pedir, assaltantes e sequestradores vĂ£o ficar interessados. Em suma: o inferno”.
As pizzas esfriaram nos pratos, ninguĂ©m comeu, e voltamos para casa atormentados pelo futuro de Dudu, nosso preocupado amigo milionĂ¡rio.
Existem as listas das dez mulheres mais bonitas, dos dez homens mais musculosos. Mas as listas dos mais ricos do mundo que sĂ£o publicadas entre os meses de abril e outubro por trĂªs prestigiosas revistas (Sunday Times da Inglaterra, Forbes e Fortune dos Estados Unidos) revelam algo surpreendente: aqui nĂ£o se trata de dez nomes.
Os ricos (muito ricos: entram sĂ³ os que possuem pelo menos um bilhĂ£o de dĂ³lares, ou seja, mil milhões de dĂ³lares) sĂ£o mais de 500 no mundo inteiro.
Os bilionĂ¡rios nĂ£o tĂªm nenhuma possibilidade de ficar escondidos no quintal de uma casa de periferia.
Os pesquisadores – analistas de primeira – sabem como juntar as informações.
Tudo isso Ă© para dizer, que os ganhadores da mega sena milionĂ¡ria, de cento e vinte e dois milhões, conforme reportagem do FantĂ¡stico, se escondem como o Dudu, codinome que dei ao amigo carioca, porque no Brasil, a violĂªncia Ă© tĂ£o grande que dizer que tem pelo menos cem mil reais, Ă© motivo de sequestro e de perigo de ser morto.
Foto: reproduĂ§Ă£o/YouTube