Parintins 2025: a TV nĂ£o acompanhou o espetĂ¡culo
A transmissĂ£o realizada pela emissora detentora dos direitos hĂ¡ mais de uma dĂ©cada destoou da grandiosidade do espetĂ¡culo

Aldenor Ferreira*
Publicado em: 05/07/2025 Ă s 00:01 | Atualizado em: 04/07/2025 Ă s 17:50
O 58º Festival FolclĂ³rico de Parintins chegou ao fim. Este ano o campeĂ£o foi o Boi-bumbĂ¡ Garantido. Segundo dados divulgados pelo Governo do Amazonas e Prefeitura de Parintins, em 2025, o evento registrou recorde de pĂºblico e consolidou-se como um dos maiores dos Ăºltimos anos.
Todavia, a transmissĂ£o realizada pela emissora detentora dos direitos hĂ¡ mais de uma dĂ©cada destoou da grandiosidade do espetĂ¡culo. Chama atenĂ§Ă£o o fato de que, mesmo apĂ³s tantos anos cobrindo o evento, a emissora parece ainda enfrentar desafios para desenvolver um know-how tĂ©cnico plenamente compatĂvel com as especificidades e a complexidade das apresentações dos bois Caprichoso e Garantido.
SaturaĂ§Ă£o de cor
Na Ăºltima ediĂ§Ă£o, em particular, a cobertura apresentou falhas. Essas sugerem uma possĂvel desconexĂ£o entre a captaĂ§Ă£o das imagens, o controle do switcher e o envio do sinal para satĂ©lite. Tanto nas apresentações do Caprichoso quanto nas do Garantido, as imagens transmitidas apresentaram forte saturaĂ§Ă£o de cor. Isso comprometeu a definiĂ§Ă£o e o reconhecimento de algumas cenas, especialmente no que se refere Ă participaĂ§Ă£o das galeras.Â
Embora eu nĂ£o seja especialista em tecnologia de TV, a impressĂ£o Ă© de que houve desequilĂbrio na configuraĂ§Ă£o das cĂ¢meras. Notou-se possĂvel excesso de ganho de cor ou balanço de branco inadequado. Chama atenĂ§Ă£o o fato de que esse problema, identificado desde os ensaios tĂ©cnicos, persistiu nas trĂªs noites do festival, sugerindo dificuldades na sua correĂ§Ă£o em tempo real.
Apesar da longa experiĂªncia cobrindo o evento, a emissora ainda demonstra certa dificuldade em consolidar uma abordagem tĂ©cnica plenamente sintonizada com a linguagem estĂ©tica e simbĂ³lica do Festival FolclĂ³rico de Parintins.
Outras inconsistĂªncias
Outro ponto que merece registro diz respeito ao Ă¡udio. Durante as apresentações, foi possĂvel notar oscilações considerĂ¡veis no volume dos microfones, tanto dos apresentadores quanto dos levantadores de toadas. Em vĂ¡rios momentos, o som estava excessivamente alto ou baixo, prejudicando a inteligibilidade e a experiĂªncia sonora do pĂºblico que acompanhava pela televisĂ£o.
TambĂ©m se observou uma desarticulaĂ§Ă£o entre os planos de cĂ¢mera e os momentos cĂªnicos das apresentações. Em ocasiões simbĂ³licas – como a descida da sinhazinha de uma alegoria – a cĂ¢mera principal focalizava outro ponto, como a galera. Essa desconexĂ£o ocorreu em diversas situações nas apresentações de ambos os bois.
Diante disso, surgem questionamentos legĂtimos: serĂ¡ que a emissora identificou essas inconsistĂªncias durante a transmissĂ£o? E, caso sim, que fatores podem ter dificultado a sua correĂ§Ă£o? No meu entendimento, as falhas de Ă¡udio e vĂdeo acabaram comprometendo nĂ£o apenas a qualidade tĂ©cnica, mas tambĂ©m a transmissĂ£o estĂ©tica e simbĂ³lica do espetĂ¡culo protagonizado por Caprichoso e Garantido.
Considerações finais
Transmitir o Festival de Parintins Ă©, sem dĂºvida, um desafio singular. Trata-se de uma manifestaĂ§Ă£o cultural profundamente enraizada na AmazĂ´nia, com uma linguagem prĂ³pria, complexa e distinta dos formatos convencionais de televisĂ£o, como o carnaval, o futebol ou shows musicais realizados em arenas esportivas.
Essa singularidade exige uma abordagem tĂ©cnica e sensĂvel, atenta Ă s dimensões simbĂ³licas, narrativas e visuais do espetĂ¡culo. Passados mais de dez anos de transmissões consecutivas, seria natural esperar que a emissora responsĂ¡vel tivesse desenvolvido uma metodologia prĂ³pria de cobertura, capaz de dar conta da riqueza performĂ¡tica do Festival de Parintins.
Penso que os problemas tĂ©cnicos e de enquadramento apresentados sugerem a necessidade de repensar nĂ£o apenas os aspectos operacionais da transmissĂ£o, mas tambĂ©m o modo como os meios de comunicaĂ§Ă£o – locais e nacionais – se relacionam com manifestações culturais que nĂ£o se enquadram nos formatos hegemĂ´nicos de cobertura.
*SociĂ³logo
Arte: Gilmal