O ocaso de um artista que abraçou o fascismo
O velho artista tinha se convertido a mais hedionda prĂ¡tica polĂtica e cultural: o fascismo

Por LĂºcio Carril*
Publicado em: 26/01/2023 Ă s 09:41 | Atualizado em: 26/01/2023 Ă s 09:41
Nunca amou os Beatles e os Rolling Stones, mas se fez artista.
Com sandĂ¡lias havaianas, calça jeans desbotada e cabelos soltos ao vento perambulava pelas ruas da cidade carregando seu violĂ£o Gianinni. Chamava atenĂ§Ă£o aquele homem de estatura mediana e estilo ripongo.
Nunca falou, mas deve ter sido influenciado pelo movimento hippie dos anos 60, quando a juventude se rebelou contra o conservadorismo dominante. Pelo menos se vestia no mesmo estilo rebelde, despojado e desafiador.
E assim fez seu nome como artista. Construiu amigos e amigas, teve mulheres, filhos e filhas. Era boa pessoa, carinhoso, atencioso.
O tempo passou. Ficou velho. Os cabelos maltratados nĂ£o mais voavam ao vento. JĂ¡ nĂ£o andava mais com seu violĂ£o – velho parceiro, como ele costuma dizer. Sempre o via caminhando, de cabeça baixa, olhar entristecido, sorriso amarelado. NĂ£o fazia mais show e seus amigos nĂ£o sabiam se ainda fazia aquelas canções que acalentavam suas noites regadas a vĂ¡rias geladas.
Certo dia todos se surpreenderam. O velho artista tinha se convertido a mais hedionda prĂ¡tica polĂtica e cultural: o fascismo.
Nas redes sociais passou a defender a violĂªncia, a censura, a homofobia e todas as coisas que caracterizam o fascismo nos dias atuais. Se tornou implacĂ¡vel. De artista popular virou um militante fascista, propagador de notĂcias falsas e seguidor de um lĂder enojado em todo o mundo.
Seus amigos e admiradores deixaram de ser seus amigos e admiradores. Aquele artista da paz, que lembrava o movimento libertĂ¡rio dos anos 60, agora era um adepto dos horrores do preconceito e da mentira.
Era o ocaso de um artista. Agora seu caminhar era titubeante e suas noites nĂ£o tinham mais luar. O desbotado da sua roupa passou a significar o cinza da infelicidade e suas sandĂ¡lias simples pisavam nas orquĂdeas terrestres.
Triste fim. O artista largou a arte para mergulhar na lama pĂºtrida do fascismo.
*O autor Ă© sociĂ³logo.