Funai e União são condenadas por danos a indígenas na BR-230

BR-230 Funai

Publicado em: 30/08/2019 às 16:13 | Atualizado em: 30/08/2019 às 16:13

A Justiça Federal no Amazonas deu um importante passo em direção à reparação de danos causados a povos indígenas pelo Estado brasileiro durante a ditadura militar, nas obras da BR-230, a Transamazônica.

Condenou, a pedido do Ministério Público Federal (MPF) no Amazonas, a Fundação Nacional do Índio (Funai) e a União pelas violações contra os povos tenharim e jiahui, que se autodenominam kagwahiva, na abertura da BR-230, entre 1969 e 1974.

Além do pagamento de R$ 10 milhões por danos morais coletivos, a sentença obriga os órgãos a implementar medidas de proteção aos locais sagrados a serem indicados pelos próprios indígenas.

Também devem promover campanha de conscientização quanto aos direitos indígenas junto aos municípios de Humaitá, Manicoré e Apuí.

Isso envolve a produção de material didático e criação de centro de memória permanente sobre a história e a cultura dos tenharim e jiahui, no prazo de seis meses.

A ação também é acompanhada pelo grupo de trabalho Povos Indígenas e Regime Militar, da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF.

 

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BR sem licença nem estudo

De acordo com a sentença, é fato confirmado que a construção da BR-230 ocorreu sem qualquer licenciamento ou estudo prévio de impacto ambiental.

Nenhuma das partes do processo nega os danos causados aos povos indígenas, apenas se limitaram a dizer que a rodovia teria sido construída há 40 anos.

A Justiça ressalta, no entanto, que todo dano ambiental é imprescritível – não deixa de ser passível de punição com o passar do tempo – e seus efeitos são permanentes, dando razão aos argumentos do MPF na ação apresentada em 2014.

 

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Funai e União omissas

A sentença considera a responsabilidade da Funai por omissão, já que deixou de agir diante da ameaça e até mesmo da consumação dos danos ambientais e morais coletivos provocados pela construção da rodovia aos indígenas.

A União, por ser titular do domínio das terras indígenas, tem o papel de garantir o respeito aos direitos indígenas, principalmente em relação à integridade de sua propriedade, dos seus costumes, da sua ancestralidade e do seu modo de vida sociocultural, responsabilidade que igualmente deixou de ser cumprida no caso da Transamazônica.

“Jamais o governo federal se preocupou com a preservação de locais sagrados, cemitérios e espaços territoriais imprescindíveis ao sentimento de pertencimento dos povos tenharim e jiahui”, afirma a Justiça.

 

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Obrigações com vítimas

Em razão de terem colaborado, por omissão, para o genocídio praticado contra os povos kagwahiva que quase os dizimou, a Funai e a União também foram condenadas a promover, no prazo máximo de seis meses, a instalação definitiva de polo-base específico da saúde indígena nas terras dos tenharim e jiahui.

A base deve ter lotação de equipe multidisciplinar e a destinação de medicamentos adequados, de acordo com o previsto pela Secretaria de Saúde Indígena (Sesai).

Há ainda determinação para realiza reforma das escolas das aldeias Coiari, Taboca e Mafuí e construção de novas unidades educacionais indígenas, no prazo de um ano.

A ação tramita na 1º Vara Federal do Amazonas, sob o número 0000243-88.2014.4.01.3200. Há possibilidade de recurso em relação à sentença.

 

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Segunda condenação

Esta é a segunda sentença da Justiça que reconhece os impactos negativos causados ao território e ao modo de vida tradicional desses povos por obras da rodovia Transamazônica (BR-230).

Na primeira delas, proferida em março de 2017 contra o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), também houve condenação ao pagamento de indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 10 milhões.

Além disso, a obrigação de recuperar as áreas degradadas pelas obras da rodovia realizadas sobre as terras indígenas tenharim marmelo e jiahui, em trecho próximo ao município de Apuí.

Há também outras medidas, como a recomposição florestal na área de preservação permanente do igarapé que teve o curso alterado pelas obras e o reflorestamento com espécies nativas para compensar o desmatamento realizado no passado.

A atuação do MPF no caso começou em abril de 2013, após reunião com lideranças das etnias tenharim e jiahui.

A partir dos relatos apresentados pelos indígenas, o MPF no Amazonas instaurou inquérito civil público para apurar a responsabilidade do Estado brasileiro por possíveis violações de direitos humanos cometidas contra os povos indígenas durante a construção da Transamazônica, no período da ditadura militar.

Fonte: MPF/Amazonas

 

Foto: Divulgação/MPF