Amazonas: Justiça reconhece direito dos waimiris-atroaris a terras de hidrelétrica

IndĂ­genas devem ser indenizados por Eletronorte, Funai e UniĂ£o. TĂ­tulos de lotes no Pitinga sĂ£o anulados

Da RedaĂ§Ă£o do BNC Amazonas

Publicado em: 25/11/2024 Ă s 23:02 | Atualizado em: 26/11/2024 Ă s 00:02

A Justiça federal reconheceu os direitos preexistentes do povo indígena waimiri-atroari sobre as terras inundadas, nos anos 1980, pela usina hidrelétrica de Balbina, no município de Presidente Figueiredo, no Amazonas.

A sentença Ă© resposta a aĂ§Ă£o civil pĂºblica movida pelo MinistĂ©rio PĂºblico Federal (MPF). 

Dessa forma, a Justiça levou em conta provas histĂ³ricas, antropolĂ³gicas e testemunhais apresentadas pelo MPF. Elas demonstraram que a etnia ocupa as terras da regiĂ£o desde o sĂ©culo 19, incluindo as Ă¡reas afetadas pela construĂ§Ă£o da hidrelĂ©trica.

Eletronorte, FundaĂ§Ă£o Nacional dos Povos IndĂ­genas (Funai) e a UniĂ£o (governo federal) foram condenadas a pagar uma indenizaĂ§Ă£o pelos danos coletivos causados aos waimiris-atroaris, que foram expulsos de suas terras para a construĂ§Ă£o da usina e sofreram prejuĂ­zos devido ao atraso na redefiniĂ§Ă£o dos limites de suas terras.

O valor da indenizaĂ§Ă£o serĂ¡ determinado em uma etapa futura do processo.

A sentença da 1ª Vara Federal CĂ­vel tambĂ©m anulou os tĂ­tulos de propriedade concedidos pelo Governo do Amazonas a particulares sobre a Ă¡rea, que havia sido indevidamente loteada, entre 1969 e 1971, desconsiderando a ocupaĂ§Ă£o dos waimiris-atroaris. 

Esses lotes, situados no chamado loteamento Pitinga, foram posteriormente desapropriados pela Eletronorte para a construĂ§Ă£o do reservatĂ³rio da usina.

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Efeito da ditadura militar

Durante a ditadura militar, os waimiris-atroaris sofreram graves violações de direitos, segundo o MPF.

Por exemplo, a execuĂ§Ă£o de obras de infraestrutura em suas terras, como a construĂ§Ă£o da usina de Balbina. 

A aĂ§Ă£o do MPF mostrou que as terras indĂ­genas haviam sido reduzidas de forma arbitrĂ¡ria por decretos federais em 1971 e 1989, limitando a Ă¡rea da reserva e desconsiderando o territĂ³rio tradicionalmente ocupado pelo grupo.

AlĂ©m disso, o Governo do Estado loteou a Ă¡rea entre 1969 e 1971 e deu tĂ­tulos de propriedade para pessoas estranhas Ă  regiĂ£o, desconsiderando a ocupaĂ§Ă£o pelos indĂ­genas. 

Posteriormente, a Eletronorte desapropriou 66 lotes de 27 proprietĂ¡rios para que a Ă¡rea fosse inundada na instalaĂ§Ă£o da usina.

O alagamento causado pela hidrelĂ©trica Balbina alterou o ecossistema, impactou no uso e ocupaĂ§Ă£o da Ă¡rea pelos indĂ­genas e fragmentou sua relaĂ§Ă£o cultural e espiritual com a terra – afetando locais sagrados e tradições ancestrais. 

O acesso ao rio UatumĂ£, por exemplo, foi prejudicado e afetou diretamente a pesca, prĂ¡tica essencial para a sobrevivĂªncia e cultura alimentar do grupo. 

Outros impactos incluem a perda de Ă¡reas de plantio, caça e coleta, fundamentais para a reproduĂ§Ă£o econĂ´mica e cultural dos waimiris-atroaris.

A Ă¡rea atual do reservatĂ³rio da usina Ă© ainda hoje utilizada pelos indĂ­genas para pesca e as terras das ilhas, formadas pela inundaĂ§Ă£o, para roças e coleta.

Foto: MĂ¡rio Vilela/Funai