Amazonas é estratégico na dinâmica do tráfico de drogas e degradação ambiental

Conclusão é de um relatório inédito sobre tráfico de drogas na Amazônia. Território amazonense se destaca nas apreensões

Amazonas é estratégico na dinâmica do tráfico de drogas e degradação ambiental

Antônio Paulo, do BNC Amazonas em Brasília

Publicado em: 28/06/2025 às 12:04 | Atualizado em: 28/06/2025 às 12:04

A Amazônia esteve em pauta no seminário “Futuro Justo, Territórios Seguros – diálogos sobre políticas antidrogas, segurança pública e desenvolvimento sustentável, nesta sexta-feira (27/6).

O evento faz parte da programação da Semana Nacional de Políticas sobre Drogas, promovido pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), por meio da Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas e Gestão de Ativos (Senad).

No entanto, um dos pontos altos dos debates foi o lançamento da nova pesquisa sobre drogas e meio ambiente. O levantamento foi produzido pelo Centro de Estudos sobre Drogas e Desenvolvimento Social Comunitário (Cedesc), em parceria com o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (Unodc).

A publicação “Tráfico de drogas na Amazônia e efeitos no meio ambiente: Uma análise exploratória” investiga possíveis relações entre a atuação de organizações criminosas que traficam drogas, degradação e crimes que afetam o meio ambiente.

Assim como estimula um olhar sobre como estas organizações criminosas exercem domínio e influência no local em que atuam, considerando a noção de governança criminal muito discutida em trabalhos acadêmicos.

Dessa forma, esse relatório inédito revela uma conexão alarmante entre tráfico de drogas e degradação ambiental, que vem ocorrendo na Amazônia, em especial no estado do Amazonas.

Amazonas é ponto estratégico

O relatório mostra o Amazonas como um estado crucial nas rotas do tráfico, tanto nacional quanto internacional. Os dados de apreensões nas polícias estaduais revelam números expressivos:

O Amazonas se destaca com apreensões de maconha superiores a 20 mil kg anuais entre 2020 e 2023, atingindo um pico de 24,5 mil kg em 2021 e registrando 20,7 mil kg em 2023.

Do mesmo modo, o estado registrou um aumento significativo nas apreensões de cocaína, alcançando 7,9 mil kg em 2023. Mato Grosso é o campeão.

No período, entre 2022 e 2023, a cocaína apreendida em Mato Grosso atingiu 23,3 mil kg e 19,8 mil kg, respectivamente. Esses são os maiores registros em toda a série de cocaína para qualquer unidade da federação.

Já o aeroporto de Manaus é o ponto crucial para apreensões de maconha com destino nacional, registrando o maior volume do Brasil em 2023, cerca de 367 kg.

Isso é o dobro do aeroporto de Guarulhos. Apreensões de cocaína também tiveram aumento em municípios centrais como Tefé e Coari.

Rotas fluviais

Os rios amazônicos são amplamente utilizados como rotas de transporte para o tráfico, especialmente para a entrada de maconha vinda da Colômbia via rios do Amazonas, que depois segue para o Pará.

A análise espacial do relatório demonstra uma preocupante sobreposição entre as dinâmicas criminais e a degradação ambiental no Amazonas. O desmatamento concentra-se principalmente na divisa do estado com Acre, Rondônia e Mato Grosso.

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Terras indígenas

Há ainda uma preocupante concentração de pistas de pouso não registradas em terras indígenas ao Norte do Amazonas, no município de São Gabriel da Cachoeira.

Aproximadamente, 28% das pistas de pouso identificadas na Amazônia estão em territórios indígenas. Essa proximidade entre apreensões de cocaína, áreas desmatadas e pistas de pouso ilegais é um indicador alarmante.

O relatório ressalta ainda que a atuação do crime organizado representa uma grave ameaça aos povos indígenas e seus territórios no Amazonas. Lideranças relataram o aliciamento de indígenas para o transporte de drogas, principalmente em regiões de fronteira com o Peru e a Colômbia.

A complexidade do território e o isolamento de muitas áreas são explorados pelos traficantes para escapar da fiscalização, adentrando terras indígenas.

Apreensões

A análise dos bens apreendidos pela Senad/MJSP reforça a interconexão dos crimes no Amazonas e na Amazônia Legal. O Amazonas, por exemplo, está entre os quatro estados da Amazônia Legal com maior volume de ativos apreendidos.

Dessa forma, o estado apresenta o maior número de embarcações apreendidas na Amazônia Legal, respondendo por 61% do total, refletindo a importância das rotas fluviais.

Na Amazônia Legal, 12% dos ativos apreendidos estão vinculados a crimes ambientais, um percentual quatro vezes maior que a média nacional de 3%.

Produtos ligados à lavagem de dinheiro representam 6% na Amazônia Legal, o dobro da média nacional, sugerindo uma dinâmica de mercado ilícito com maior convergência criminal na região.

Ecossistema do crime

Em resumo, o relatório revela que o tráfico de drogas na Amazônia, e particularmente no Amazonas, não é uma atividade isolada, mas um componente central de um ecossistema do crime que impulsiona a degradação ambiental, especialmente o desmatamento, e ameaça a vida e a cultura dos povos indígenas.

“A vastidão territorial e a capacidade das organizações criminosas de explorar lacunas estatais tornam a Amazônia um cenário desafiador que exige respostas integradas e intersetoriais para proteger a floresta e suas populações”,

afirmam os pesquisadores.

Por fim, o Cdesc e seus parceiros reiteram o compromisso de aprofundar o entendimento dessas dinâmicas para subsidiar políticas públicas mais eficazes no enfrentamento aos desafios impostos pelo tráfico de drogas e seus impactos ambientais e sociais na Amazônia.

Veja o estudo completo:

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