DiĂ¡rio de uma quarentena | 28º dia, 17 de abril – DelĂ­rios

"Eu tive delĂ­rios, muitos delĂ­rios. Eu escrevi todos esses delĂ­rios"

De Neuton CorrĂªa*

Publicado em: 17/04/2020 Ă s 22:26 | Atualizado em: 17/04/2020 Ă s 22:26

Hoje Ă© sexta-feira. SĂ£o 21h09.

O Amazonas conta agora 1.809 pessoas contaminadas, confirmadas, pelo novo coronavĂ­rus (Covid-19).

O nĂºmero de mortes saltou de 124 para 145 em 24 horas. Foram 21 Ă³bitos de ontem para hoje.

Hoje, a letalidade no Estado é maior do que a média nacional (6,4%). Aqui, chegou a 8,02%.

Em Manaus, o grau de contaminaĂ§Ă£o assusta.

O vĂ­rus estĂ¡ em todos os bairros, segunda as autoridades de saĂºde.

Da mesma forma, a doença se alastra pelo interior do Estado. Ao menos 35% dos 61 municĂ­pios jĂ¡ registraram casos.

Em Maués, a doença chegou às aldeias sateré mawé, onde vivem sete mil índios.

Um indĂ­gena morreu e ele hĂ¡ meses nĂ£o ia Ă  cidade.

 

Recorde nacional

O nĂºmero de mortes pelo vĂ­rus no Brasil bateu recorde de ontem para hoje: 217, em 24 horas.

Com isso, o paĂ­s jĂ¡ registra 2.141 mortos na pandemia, por enquanto.

Por enquanto, porque as autoridades de saĂºde prevĂªem um salto ainda maior.

O presidente da RepĂºblica voltou a defender a flexibilizaĂ§Ă£o da quarentena. Isso pode significar ainda mais o aumento de contaminaĂ§Ă£o e mortes.

 

Festa no hospital

HĂ¡ pouco houve festa no hospital Adventista de Manaus para comemorar a saĂ­da do Nelsinho da UTI.

AntĂ´nio Nelson Oliveira JĂºnior, secretĂ¡rio Municipal de Meio Ambiente e Sustentabilidade da Prefeitura de Manaus (Semmas), estava internado hĂ¡ 25 dias e ficou 13 intubado.

Contaminado pela peste, ele lutou bravamente.

As histĂ³rias de cura se repetem nos hospitais, que agora estĂ£o recebendo cĂ¢maras frigorĂ­ficas para congelar os mortos.

 

DelĂ­rios

Lembram do amigo sobre o qual venho escrevendo desde o começo da semana?

TenĂ³rio Telles (foto), TenĂ³rio Nunes Telles de Menezes, 56 anos, imortal da Academia Amazonense de Letras, teve alta no começo da noite.

Lutou pela vida contra o coronavĂ­rus desde o sĂ¡bado passado.

Na segunda-feira, ele chegou a se despedir dos amigos.

Recebi a notĂ­cia e procurei me informar com os amigos do hospital Samel, onde ele estava internado.

Um amigo, que passei a chamĂ¡-lo de anjo, me respondeu: “Ele nĂ£o vai morrer e ainda vai viver muito”.

Antes da saĂ­da dele do hospital, o anjo me ligou e disse hoje:

“Seu amigo recebeu alta e sĂ³ estĂ¡ esperando os papeis para sair”.

No ato liguei para ele.

“TenĂ³rio, falei muito sobre vocĂª para os amigos que estĂ£o acompanhando este diĂ¡rio. Disse que vocĂª iria escrever alguma coisa para contar sua experiĂªncia nessa luta”.

E ele me respondeu:

“Eu tive delĂ­rios, muitos delĂ­rios. Essa doença faz a gente sentir tanta dor que hĂ¡ momentos em que, em mim, a dor desaparecia e eu tinha delĂ­rios. Eu escrevi todos esses delĂ­rios e quero que vocĂª publique-os”

Assim como vocĂªs, jĂ¡ estou Ă  espera.

 

Foto: ColaboraĂ§Ă£o de internauta

*O autor é jornalista e diretor-presidente do BNC Amazonas