BR-319: ‘Qual a segurança que temos para nos prevenir desse impacto?’
Questionamento é de líder comunitária do Amazonas imaginando danos ao meio ambiente com pavimentação da rodovia.

Publicado em: 11/08/2025 às 09:58 | Atualizado em: 11/08/2025 às 09:58
Às margens da BR-319, 58 famílias aguardam há duas décadas a definição sobre a pavimentação de 52 km no trecho central da rodovia.
O impasse opõe a necessidade de melhorar o transporte à preservação da floresta amazônica, uma das mais importantes do planeta.
Moradora de Santo Antônio do Mamori, Nilcinha Amaral apoia a obra, mas teme as mudanças que ela trará.
“A gente sabe que vai facilitar a vinda de grãos, o acesso aos alimentos, como carne e frango. Aí pergunto: qual o projeto que está sendo feito para isso? O que contempla? Qual a segurança que nós, que moramos no entorno da BR, temos para nos prevenir desse impacto? Quais são os projetos que vêm atender essas comunidades?”, questiona.
Riscos ambientais
Estudo da Universidade Federal de Minas Gerais estima que a pavimentação gere 8 bilhões de toneladas de CO₂, equivalentes a 22 anos de desmatamento.
O trecho atravessa áreas de preservação ambiental, terras indígenas e comunidades rurais, aumentando o risco de grilagem, abertura de ramais e expansão da devastação.
O Observatório do Clima defende que a obra só ocorra com governança adequada, regularização fundiária e fiscalização permanente.
“A estrada é impossível hoje, porque não tem condições de governança na região”, afirma a coordenadora de políticas públicas Suely Araújo.
Disputa judicial e decisões recentes
A pavimentação é alvo de ações judiciais desde os anos 2000. Em julho, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região restabeleceu a suspensão da licença prévia emitida em 2022 pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
Antes, a 7ª Vara Federal Ambiental e Agrária do Amazonas havia suspendido a autorização por “riscos de danos irreversíveis à floresta amazônica”.
No Congresso, um projeto de lei aprovado em julho flexibilizou regras para licenciamento ambiental, mas o governo vetou dispositivos que diminuíam o poder de fiscalização federal.
Comunidades
Apesar das preocupações, grande parte dos moradores da região quer a pavimentação, desde que respeite o meio ambiente e a vida local.
“As pessoas querem, mas de forma que garanta a permanência desses povos da floresta, da fauna e da flora”, afirma Raquel Bastos, técnica da ONG Casa do Rio.
A precariedade da rodovia afeta o transporte, eleva preços de produtos e dificulta o acesso a serviços de saúde e educação.
Nilcinha reforça: “Era para escola estar lá, para o hospital estar lá, para as necessidades básicas serem supridas por causa da BR, e não porque eu vou facilitar a chegada a Manaus”.
Governo
O Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima e o Ministério dos Transportes elaboram um plano para ordenar o território e fortalecer atividades produtivas sustentáveis.
A proposta inclui criação de áreas protegidas, destinação de florestas públicas, reconhecimento de povos tradicionais e combate a crimes ambientais.
“Espera-se que a implementação do plano alcance resultados concretos na redução do desmatamento, da grilagem e de incêndios na região”, diz a pasta.
Infraestrutura e sustentabilidade
Especialistas defendem que o projeto considere drenagem, segurança e uso de materiais duráveis. Obras mal fiscalizadas e pavimento de baixa qualidade geram buracos e rachaduras rapidamente, aumentando custos e impactos ambientais.
Medidas como túneis para fauna, recuperação florestal e iluminação eficiente são apontadas como essenciais para tornar rodovias mais sustentáveis.
Para Marcus Quintella, da Fundação Getúlio Vargas, é preciso “prever sistemas de drenagem e gestão permanente da faixa de domínio, em tempo real e com fiscalização efetiva”.
Caminho para o consenso
No contexto da Conferência do Clima (COP-30), sediada na Amazônia, a BR-319 se torna símbolo do desafio de conciliar desenvolvimento econômico, mobilidade e preservação ambiental.
Para moradores, ambientalistas e governo, o desafio é avançar com a obra sem repetir erros que comprometam o futuro da floresta e das comunidades.
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