Ufam está de costas para indígenas, dizem lideranças

Indígenas cobram vestibular e concursos específicos, além do ensino de línguas indígenas nos cursos da universidade.

Wilson Nogueira, da Redação do BNC Amazonas

Publicado em: 08/07/2025 às 19:13 | Atualizado em: 08/07/2025 às 19:13

A Universidade Federal do Amazonas (Ufam), embora centenária, se mantém de costas para os povos originários, segundo atestam lideranças do movimento estudantil indígena amazonense.

A Ufam reivindica a sua origem na Universidade Livre de Manáos (ULM), criada em 1906, e assume o status de universidade mais antiga do Brasil.

Danielle Gonzaga, da etnia munduruku, empossada diretora do Departamento de Políticas Afirmativas da Pró-Reitoria de Extensão da Ufam, disse que a nova reitoria precisa, urgentemente, oferecer vestibular e concurso público específicos para pessoas indígenas.

Ao mesmo tempo, deve reconhecer os direitos e o conhecimento dos povos originários, assim como faz com os das ciências do ocidente.

Ela é professora do curso de letras da Ufam, campus de Humaitá, no sul do estado.

“Esse cargo, para nós, é fundamental para a institucionalização e formação de uma universidade mais indígena e mais plural, pela qual lutamos há muito tempo.”

Danielle ressalta que o mesmo cargo já foi ocupado por Gersen Baniwa, liderança indígena do alto rio Negro, hoje professor da Universidade de Brasília (UNB).

“O professor Gersen intensificou essa luta e deu mais visibilidade às nossas reivindicações”.

Ela disse ainda que vai mediar o diálogo entre a Ufam e as instituições estudantis indígenas para assegurar e ampliar conquistas no âmbito do ensino superior nas universidades públicas.

A Ufam oferece hoje um curso de licenciatura intercultural, instalado na Faculdade de Educação (Faced), para a formação de professores indígenas, e o colegiado indígena do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social, exemplos dos resultados dos diálogos entre indígenas e a reitoria.

A atual reitoria, por intermédio da reitora Tanara Lauschner, assumiu debater a pauta de reivindicações do fórum dos estudantes indígenas que deliberou sobre temas que aproximam a Ufam dos povos indígenas.

“Assim, entendemos que a Ufam reconhece as representações estudantis indígenas e as chamam para o debate sério”, disse Danielle.

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Línguas indígenas

A liderança indígena lembrou, para reafirmar a constatação de que Ufam está de costas para os povos originários, a inexistência do ensino de línguas indígenas na sua grade de cursos.

“O que houve foi algumas iniciativas pontuais de professores da Faced e dos cursos de ciências sociais, em parceria com entidades indígenas. Mas, ainda não passou disso. Está tudo na estaca zero”, afirmou Danielle.

A professora disse acreditar que a pauta dos estudantes indígenas vai andar porque a nova reitoria da Ufam a carimbou como assunto de urgência e reafirmou esse compromisso na cerimônia pública de posse, nesse 4 de julho.

O tema é lastreado pelo fato de existirem 53 línguas indígenas faladas no Amazonas, das quais 16 estão reconhecidas como oficiais, entre elas, nheengatu, tucano, baniwa e tariano.

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE-2023), por sua vez, atesta que a população indígena do Amazonas é de 183.514, dado que torna o estado o mais indígena do país.

Protagonismo

Isabel Cristine Munduruku, coordenadora do Movimento dos Estudantes Indígenas do Amazonas (Meia), faz coro com Danielle:

“O primeiro passo que a Ufam deve tomar é reconhecer o protagonismo das pessoas indígena no ensino e no seu quadro de servidores. Daí vem a necessidade do vestibular e do concurso público a serem ofertados a nós, indígenas, de modo permanente”.

Para Isabel, esse processo levará, se depender da força política dos estudantes indígenas, “à inserção dos jovens no ensino superior, na valorização dos professores e reconhecimento da ciência dos nossos ancestrais, assim como a universidade reconhece a ciência ocidental”.

Fotomontagem com imagens de Wilson Nogueira/especial para o BNC Amazonas