Posse da nova reitora da Ufam é cheia de significado indígena
Nova reitora da Ufam toma posse com ritual indígena e reafirma inclusão.

Diamantino Junior
Publicado em: 05/07/2025 às 16:35 | Atualizado em: 05/07/2025 às 18:16
A cerimônia de posse da reitora da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Tanara Laushner incorporou simbolismo e ritual indígena, expressando o compromisso da nova reitora em tornar a universidade cada vez mais inclusiva e participativa da presença dos povos indígenas do Amazonas.
A solenidade teve como plateia indígenas de diferentes etnias que são estudantes da licenciatura indígena, participantes de movimentos sociais e partidos políticos.

O ritual bahsese
A cerimônia de posse de teve início às 19h45 com a entrada de Tanara e Geone Maia, vice-reitor e demais gestores a tomar posse pela entrada principal do auditório Eulálio Chaves.
Antes do cortejo, Jaime Diakara, kumu (um dos tipos de xamã) do povo Desana e doutorando em antropologia social da Ufam, iniciou um ritual bahsese.
O cerimonialista da instituição vestido de terno, segurou o microfone para que Jaime Diakara pudesse realizar o ritual e, ao mesmo tempo, todos pudessem ouvir seu canto.
Em uma das mãos, Diakara segurava um cariçu, uma flauta, e, na outra, um maracá, ambos instrumentos sagrados para os povos do alto rio negro.
O kumu vestia seu traje ritual: sobre uma bermuda preta, vestia uma tanga, ambos com grafismos, braçadeiras de penas, um colar e cocar.
No calcanhar, levava um tipo de maracá, que sinaliza o compasso da dança.
Diakara entoou os cantos e tocou os instrumentos sagrados que antecederam a passagem de Tanara Laushner e o cortejo de gestores pelo corredor até a frente do palco.
Em seguida, antes que alguém subisse ao palco, Diakara deixou os instrumentos, e passou a baforar o tabaco da purificação no espaço onde sentariam as autoridades. Baforou tabaco sobre o rosto de Tanara e Geone.
E, enquanto as autoridades subiam para compor a mesa de abertura, Diakara retornou ao salão baforando tabaco em todos os corredores do amplo auditório, desse modo, purificando todo o espaço onde ocorreria o ritual de posse.
O ritual bahsese foi apresentado como uma “benção indígena”, embora sua finalidade seja de purificar.
Vestes com significado

A ritualística das cerimônias institucionais no mundo branco é rigidamente marcada pela sobriedade e suas cores são o preto e o branco.
Assim, viu-se que Tanara Laushner imprimiu o que pôde das culturas indígenas rionegrinas em suas vestes rituais.
Quando chegou ao auditório, antes da cerimônia, viu-se que o vestido usado sob a beca, do estilista indígena Sioduhi, era em tons laranja, com desenho de duas cobras no busto – o animal é fundacional na mitologia dos povos indígenas do alto rio negro.
A pelerine, manto branco que se coloca sobre a beca preta, foi bordada com as representações das constelações que organizam o calendário cosmológico rionegrino. Porém, o bordado em branco, era muito discreto e não se podia perceber de longe.
O ritual dos brancos
O mundo dos brancos também é cheio de rituais, comumente, chamados de cerimônia ou solenidade, como as de posse de um cargo público.
São rituais que seguem hierarquias e, supostamente, marcam a racionalidade de suas instituições.
As cores preto e branco devem demarcar a impessoalidade e imprimir aos iniciados a marca do bem público, evitando personalizar os cargos.
No caso do cargo de reitoria, a transição do capelo (chapéu) de uma reitora/o para outra/o marca a passagem simbólica do cargo.
Apenas a reitora e seu vice falaram ao público. Os demais gestores assinaram os papéis de posse diante da plateia, já que, para os brancos, o compromisso é firmado mais em papeis do que em palavras.
Na plateia, a presença dos indígenas de corpos pintados, empunhando bandeiras de seus movimentos políticos, usando cocares e sacudindo maracás ao invés de aplaudir, como os demais, revela a UFAM como a universidade federal do estado mais indígena do país.
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O que se viu na cerimônia de posse da nova reitora, Tanara Laushner e seu vice Geone Maia, ao incorporar rituais e simbologia indígenas no ritual de despessoalização das instituições públicas dos brancos, personalizou a Ufam como ela precisa ser, o mais indígena possível.
Fotos: Ronaldo Siqueira/Especial para o BNC Amazonas