E foi sĂ³ a primeira noite
Na hora de brincar, os bois-bumbĂ¡s Garantido e Caprichoso jorraram criatividade sem parar

Dassuem Nogueira, especial para o BNC Amazonas
Publicado em: 01/07/2023 Ă s 15:14 | Atualizado em: 02/07/2023 Ă s 18:30
NĂ£o houve minuto vazio nas apresentações da primeira noite do 56º Festival FolclĂ³rico de Parintins. Na hora de brincar, os bois-bumbĂ¡s Garantido e Caprichoso jorraram criatividade sem parar. Cada boi em sua especialidade.
Garantido, com o tema “Por toda vida”, começou sua apresentaĂ§Ă£o emocionando. Em meio a uma crise que chegou a ameaçar a presença do boi na arena, Israel Paulain, o apresentador, iniciou o espetĂ¡culo de mĂ£os dadas com os sĂmbolos da força espiritual do boi: dona Maria Monteverde, a mais velha da famĂlia fundadora, uma trabalhadora do galpĂ£o e o prĂ³prio boi Garantido. Trouxe ainda sua comunidade de trabalhadoras e trabalhadores da arte para o centro da arena, conclamando a força de sua comunidade.
No jogo de xadrez da disputa, lançou mĂ£o de suas toadas nacionalmente conhecidas: “Vermelho” (Chico da Silva) e “Tic tic tac” (Braulino Lima). Em seguida, o ritual “NominaĂ§Ă£o KaiapĂ³” (Marcos Moura), colocou no tabuleiro o pajĂ© Adriano PaketĂ¡.
O artista Ă© da comunidade da baixa do SĂ£o JosĂ©, reduto do boi Garantido, e tem forte popularidade.
Liderança mundialmente conhecida, o cacique Raoni, nominado no ritual, apresentou-se aos jurados e abençoou o levantador de toadas SebastiĂ£o JĂºnior para defender toada letra e mĂºsica: “A festa da natureza” (Demetrios Haidos, Geandro Pantoja e Naferson Cruz).
O espetĂ¡culo “Garantido por toda a vida” veio carregado de simbologias que comunicaram fĂ¡cil a sua mensagem: toda vida viva!
A ver pela apresentaĂ§Ă£o de Pai Francisco e MĂ£e Catirina, sĂmbolos negros do auto do boi, dançando em libras, no meio do coraĂ§Ă£o vermelho que se formou na dança do povo indĂgena KaiapĂ³.
Diante de um instrumento de percussĂ£o em formato de flauta de pĂ£, sĂmbolo da mĂºsica andina, o pajĂ© vermelho ainda se apresentou em espanhol. O ato faz referĂªncia Ă pan-AmazĂ´nia, formada pelos paĂses de colonizaĂ§Ă£o espanhola. Clamando pelo bem viver de todas as vidas, dançou expressivamente um cadeirante.
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Crise exposta
Tal como conta a lenda de sua prĂ³pria nominaĂ§Ă£o, Garantido se garantiu. NĂ£o deixou sua cabeça cair no chĂ£o.
No entanto, por maior e indiscutĂvel que seja a força espiritual de sua comunidade, viram-se as consequĂªncias da crise extra-arena vivida pelo boi.
Muitas alegorias claramente nĂ£o entraram, fazendo a Sinhazinha da Fazenda entrar por detrĂ¡s de um cenĂ¡rio incompleto. Ela evoluiu enquanto o boi corria para a dispersĂ£o.
No dia de abrir o festival, o Garantido ainda corria para transportar suas alegorias. Algumas quebraram e nĂ£o tiveram tempo de ser consertadas, disse o presidente em exercĂcio.
Viu-se ainda um tenebroso acidente com a Rainha do Folclore, que despencou de sua alegoria. A queda afrouxou a cabeça de sua fantasia. PorĂ©m, a habilidosa Edilene Tavares, literalmente, nĂ£o deixou sua coroa cair.
A fantasia da CunhĂ£-Poranga se desmontou em plena arena, deixando Isabele Nogueira de seios expostos em sua evoluĂ§Ă£o. Isabele evoluiu escondendo os seios sob os cabelos. No entanto, foi exposta em excesso.
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O poderio Caprichoso
Ao contrĂ¡rio, o boi Caprichoso apresentou-se sem erros dessa natureza. Adentrou na arena exibindo todo o seu poderio artĂstico.
O enorme e caro guindaste trouxe o boi do alto, enfeitado por um impressionante balé nas alturas.
No xadrez das apresentações, para enfrentar a simbologia do batuqueiro Reck Monteverde, neto do fundador do boi contrĂ¡rio, Caprichoso trouxe Bacuri, o mais velho dos seus marujeiros.
Se a força espiritual do Garantido estĂ¡ em sua tradiĂ§Ă£o, a do Caprichoso, certamente, estĂ¡ no trabalho que faz com suas crianças.
O boi azul levou para a sua entrada na arena as crianças que estudam na Escolinha de Artes mantida pela agremiaĂ§Ă£o.
O primeiro conjunto alegĂ³rico apresentou trĂªs camadas de alegoria, trabalhando sua execuĂ§Ă£o no chĂ£o e no ar.
Neste ano ainda se nota uma musicalidade mais rica, cheia de efeitos sonoros e trilhas que criam o clima das execuções cĂªnicas. Estas, marcadas por forte teatralidade.
AlĂ©m de recursos de iluminaĂ§Ă£o que nĂ£o deixavam espaço vazio na arena.
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O brado munduruku
Contudo, a simbologia acionada pelo Caprichoso Ă© mais complexa.
Um dos pontos altos de sua apresentaĂ§Ă£o foi a presença da mulher Munduruku no espetĂ¡culo. Marciele Munduruku apresentou seu item cantando pela primeira vez na arena.
Ao seu lado, a liderança Alessandra Munduruku falou em defesa das Ă¡guas do rio TapajĂ³s, disse nĂ£o ao marco temporal e levantou a bandeira da AmazĂ´nia em pĂ©.
O item CunhĂ£-Poranga Ă© representaĂ§Ă£o da beleza e da força guerreira das mulheres indĂgenas. Alessanda Munduruku Ă© representante da luta de seu povo. Juntas, representaĂ§Ă£o e representante da mulher indĂgena, bradaram arte e polĂtica na arena.
É sĂ³ o começo!
E assim foi apenas a primeira noite da arte de brincar dos bois Caprichoso e Garantido.
Os bois colocaram em jogo suas qualidades mais marcantes.
Garantido veio mais folclĂ³rico e emocionante, Caprichoso foi minucioso em seu trabalho de arena.
A primeira noite de festival ainda foi brindada por uma chuva torrencial que fez a gentileza de esperar o final da apresentaĂ§Ă£o do Caprichoso.
Fotos: DivulgaĂ§Ă£o