Empreiteira garantiu R$ 620 milhões do governo com empresa ‘fake’

A Engefort foi a única empreiteira que participou de todas essas licitações no Distrito Federal e nos 15 estados abrangidos pela Codevasf

Bolsonaro Ponte São Gabriel da Cachoeira

Publicado em: 11/04/2022 às 11:02 | Atualizado em: 11/04/2022 às 11:02

A empreiteira Engefort tem conquistado a maioria das concorrências de pavimentação do governo Bolsonaro em diferentes licitações nas quais participou sozinha ou na companhia de uma empresa de fachada registrada em nome do irmão de seus sócios.

A construtora, com sede em Imperatriz, sul do Maranhão, explodiu em verbas na atual gestão e sob Bolsonaro foge de sua tradição ao obter também contratos para asfaltamento longe de sua base.

Até agora, o governo reservou cerca de R$ 620 milhões do Orçamento para pagamentos à empresa — o valor total já quitado a ela soma R$ 84,6 milhões. Apesar do volume, a empresa é uma caixa-preta e silencia sobre seus contratos e a firma de fachada usadas nas concorrências.

Leia mais

Governo Bolsonaro negocia com Braga venda da Eletrobrás

A fonte de recursos dela são contratos com a Codevasf, estatal federal entregue por Bolsonaro ao centrão em troca de apoio político, e as verbas das emendas parlamentares, ampliadas no esquema do toma-lá-dá-cá pelo Congresso no atual governo.

Procurada, a Codevasf não respondeu aos questionamentos específicos sobre a Engefort.

Os volumes totais empenhados pelo governo federal, atrás da LCM Construção, que acumulou R$ 843 milhões em verbas reservadas. ​

Folha analisou documentos de 99 concorrências de pavimentação da Codevasf realizadas em 2021 por meio de um tipo de licitação simplificada chamada pregão eletrônico, que ocorre de forma online.

Esses pregões, como mostrou a Folha neste final de semana, fazem parte de uma manobra licitatória que passou a ser usada em larga escala sob Bolsonaro para dar vazão aos recursos bilionários das ​emendas parlamentares, distribuídas a deputados e senadores com base em critérios políticos e que dão sustentação ao governo no Congresso.

A estratégia deixa em segundo plano o planejamento, a qualidade e a fiscalização, abrindo margem para serviços precários, desvios, superfaturamentos e corrupção.

Na Codevasf, as concorrências envolveram diferentes tipos de pavimentação, como asfalto com CBUQ (Concreto Betuminoso Usinado a Quente), asfalto com TSD (Tratamento Superficial Duplo), bloquetes de concreto e paralelepípedos.

A Engefort foi a única empreiteira que participou de todas essas licitações no Distrito Federal e nos 15 estados abrangidos pela Codevasf. A empreiteira ganhou 53 concorrências, ou mais da metade dos pregões.

O desempenho mais expressivo foi em Minas Gerais, tendo conquistado 28 de 42 licitações nas modalidades asfalto CBUQ e bloquetes.

Apesar de o setor de construção pesada ter mais de 200 empresas em Minas Gerais, em 10 dos 21 pregões para serviços com bloquetes de concreto a Engefort concorreu sozinha e levou os contratos.

Isso é permitido pela lei em situações excepcionais. Em vários casos, a firma ganhou com o preço praticamente cheio, tendo dado um desconto de apenas 0,01% em relação aos valores de referência dos pregões.

Em parte das concorrências da Codevasf, a Engefort teve a companhia de uma empresa que a Folha descobriu ser de fachada: a Del Construtora Ltda., registrada em nome de um dos irmãos dos sócios da líder Engefort.

Um dos casos que mais chamam a atenção é o do pregão eletrônico que levou à assinatura de um contrato no valor de R$ 62,5 milhões para pavimentação no Amapá.

Nessa licitação, as duas únicas empresas participantes foram a Engefort e a Del.

Na documentação apresentada pela Engefort para a disputa, constam como sócios da empresa Carlos Eduardo Del Castilho e Carla Cristiane Del Castilho.

Segundo a ata do pregão, a Del chegou a enviar um link para acesso à sua documentação, porém a pasta estava vazia. Se a firma tivesse apresentado os papéis, teria sido possível verificar que o sócio administrador da Del é Antonio Carlos Del Castilho Júnior, irmão dos sócios da Engefort.

A falta da documentação levou a Del a ser desclassificada, e a Engefort ganhou o contrato também praticamente pelo valor cheio.

Leia mais na Folha

Foto: Marcos Corrêa/PR